A criançada certamente sabe brincar de caçado ou caçador, como se diz no Rio Grande do Sul, queimado, em Pernambuco, ou queimada, em São Paulo. Simples e popular, esse jogo com bola é muitas vezes mal aproveitado na escola. Geralmente, é subestimado e acaba sendo usado só como uma atividade de aquecimento no início das aulas de Educação Física ou em propostas livres, que se encerram no próprio jogo.
Que tal pensar em explorá-lo ao máximo, trabalhando a diversidade das formas de jogar em prol dos objetivos de aprendizagem? Foi o que fez Vinicius da Silva, professor do 5º ano da EMEF Elza Regina Bevilacqua, em São José dos Campos, a 94 quilômetros da capital paulista. "Os alunos já jogavam queimada por vontade própria, fora da escola e nos intervalos. Além de ajudá-los a refletir sobre os movimentos, quis desafiá-los com outras variedades", diz o educador.
Ele começou a sequência didática perguntando o que as crianças sabiam sobre a queimada. Elas descreveram as regras que usavam e Silva concluiu que a turma brincava da maneira tradicional. Ou seja, os jogadores são divididos em duas equipes - cada uma ocupa metade da quadra, separada por uma linha. É usada uma bola e quem estiver com ela em mãos precisa atingir membros do time rival, que por sua vez só são queimados se a bola tocar alguma parte do corpo deles e cair no chão. Se eles conseguem agarrá-la, estão salvos. Se são queimados, vão para o fundo do campo adversário, chamado morto ou cemitério. Dali, tentam atingir os oponentes com a bola. Vence a equipe que queimar todos os adversários primeiro.
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Falar sobre o jogo para se sair melhor
Para fazer a turma começar a se mexer, refletir sobre os movimentos envolvidos na brincadeira e conhecer novas formas de jogar, Silva propôs inicialmente o que chamou de queimada individual. Nesse jeito de brincar, os participantes ficam espalhados pela quadra e quem pega a bola deve tentar atingir qualquer um dos colegas. Não há cemitério: aqueles que são queimados devem sentar no chão e permanecer assim até o fim da partida. "Como não há times, todos têm de fugir de todos. Esse trabalho foca bastante em aprender a se esquivar", conta o educador.
Para que a meninada também possa praticar os movimentos de agarrar e arremessar, vale criar situações de jogo em que todos os alunos interajam com a bola por bastante tempo. Uma proposta que contempla esse objetivo é formar duplas. Cada criança deve ora se defender da bola (pensando em maneiras de se esquivar), ora atacar (observando se tem mais firmeza jogando com as duas mãos ou com uma só e com que intensidade precisa arremessar para acertar o colega - quanto mais perto o adversário estiver, menos força é preciso). "Uma opção, nesse momento, é estipular algumas distâncias entre os estudantes. Assim, evitamos que alguém se machuque", explica Júlio César Soares Pereira, professor da Escola da Vila, em São Paulo.
Realizada a atividade da queimada individual, Silva dividiu os alunos em dois times e pediu que jogassem de acordo com as regras que conheciam, retomando o que tinham conversado no início. É um momento rico de observação. O professor pode analisar se os estudantes colocam em cena táticas coletivas ou se jogam de modo individualizado e quais as principais preocupações deles - queimar muitos adversários ou se defender para ser o último em quadra, por exemplo.
Terminado o jogo, Silva conversou com os alunos: "O que acharam da partida?". "O que pode ser feito para solucionar os problemas?", e "Alguém acha que não teve oportunidade de participar bastante?" Era hora de falar sobre a importância das estratégias. "Uma estudante reclamou que mal pegou a bola. Então, perguntei se ajudaria ela ter se posicionado em uma parte da quadra que tivesse ficado vazia mas que fosse interessante para queimar um adversário", conta o educador. Problematizações como essa ajudam as crianças a refletir sobre as nuances do jogo e as várias táticas que podem ser desenvolvidas. Quem é bom queimador, por exemplo, pode se deixar queimar de propósito para poder, estando no morto, ajudar os colegas a eliminar mais jogadores do outro time. Pensar sobre isso faz com que mitos sejam derrubados, como achar que ser logo atingido é necessariamente ruim e que o bom jogador é aquele que nunca é queimado.
Durante a reflexão, vale também chamar a atenção da classe: não é necessário ser bom na realização de todos os movimentos (arremessar, agarrar, correr etc.). "Um jogador pode não tocar a bola o jogo inteiro, se preocupando só em fugir para ser o último em quadra, fazendo seu time vencer", diz Marcos Garcia Neira, docente da Universidade de São Paulo (USP).
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